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Política

Se ficar, o bicho come!

Se ficar, o bicho come!

É fato inconteste que o governo federal está vivendo o pior dos mundos, em meio à crise política sem precedentes na história republicana, com drásticas rupturas na sua relação com o Congresso Nacional. A presidente Dilma Rousseff enfrentará nos próximos dias consideráveis desgastes com os vetos que ela será obrigada a fazer no que diz respeito ao reajuste do Judiciário e das aposentadorias dos cidadãos comuns. As alternativas do governo são exíguas ou praticamente inexistem, por isso, ele está no fio da navalha – enquanto a população está entre a cruz e a espada faz tempo. Com certeza Dilma cometerá uma “injustiça” com o Judiciário e não fará “justiça social” com os aposentados. O problema é exclusivo do governo federal, que terá que descascar o abacaxi da entressafra, mas, as consequências afetarão os nossos bolsos no médio prazo, porque a corda arrebenta sempre do lado mais fraco, neste caso, do lado do povo, que está condenado a pagar as contas que não contraiu de livre vontade. A questão das aposentadorias não é o maior dilema de Dilma Rousseff. Além disso, a presidente tem rezado aos Deuses do Olimpo para que a ajudem nas suas defesas junto ao TCU – Tribunal de Contas da União (Pedaladas Fiscais) e TSE – Tribunal Superior Eleitoral (Registro de Candidatura). Ainda vem muito chumbo grosso por aí. Queijo de boa qualidade está sendo colocado nas ratoeiras; para que algumas ratazanas possam escapar, outras estão marcadas para cair nelas. O pior tende a piorar.

Uma MP, Medida Provisória, aprovada pelo Congresso Nacional, prorrogou até 2019 o modelo atual de reajuste do salário mínimo, mas estendeu esta regra de aumento para todas as demais aposentadorias. Hoje o INSS tem 32 milhões de beneficiários, dos quais cerca de 10 milhões de benefícios estão acima do piso previdenciário. A medida, se sancionada, causará uma despesa extra anual nas contas da Previdência no montante de R$ 9,2 bilhões – só neste ano de 2015 chegará a R$ 4,6 bilhões. Segundo o jornal metro (www.metrojornal.com.br), Grande Vitória, segunda-feira, 13 de julho de 2015, “A proposta ainda não foi encaminhada ao Palácio do Planalto. Assim que chegar, o governo terá 15 dias úteis para informar sobre sanção ou veto. Dilma deve vetar, mas ainda não definiu como será feita a compensação para oferecer aos aposentados que ganham acima de um salário mínimo”. A dúvida dos 10 milhões de aposentados – que com as suas contribuições ajudaram a “sustentar” os outros 22 milhões de beneficiários – está justamente na tal compensação oferecida pelo governo. Gato escaldado tem medo de água fria, de modo que não dá pra confiar num governo que carece de credibilidade, que diz uma coisa de manhã, faz outra à tarde e pensa diferente à noite. A batata inglesa saiu do fogo e irá quente para as mãos do governo, que decidirá se a come queimando a garganta ou se a devolve aos cozinheiros congressistas na bandeja de vetos.

Sem entrar no mérito da questão, até porque meia dúzia de palavras não encerrará o assunto, algumas considerações devem e precisam ser feitas, sem sensacionalismos palacianos. A maioria dos aposentados e pensionistas está endividada no crédito consignado, resultado da falta de uma política específica de reposição das perdas salariais e, sobretudo, da negação do governo federal em conceder aumento real para a categoria. Cobriu-se um santo e despiu-se outro. Com a política de valorização do salário mínimo o governo optou por sacrificar justamente a classe de trabalhadores que ao longo da vida descontou religiosamente em folha a sua cota para o INSS. A justiça social deixa de existir na sua integralidade quando há declarados interesses assistencialistas por parte do governo, declaradamente com fins eleitoreiros. Para um lado ganhar, o outro tem que perder – infelizmente, o governo não governa para todos, não há critérios de unicidade, de equidade, adota como prática continuada políticas públicas contemplativas, a seu modo, a seu bel-prazer. É aquela velha questão: Manda quem pode.

O governo federal editou a Medida Provisória 681 (publicada no DOU – Diário Oficial da União desta segunda-feira, 13/07/2015) ampliando de 30% para 35% o “crédito consignado” para desconto direto em folha. O novo limite de comprometimento da renda dos trabalhadores, dos aposentados e pensionistas do INSS, e dos servidores públicos em geral, não resolverá o problema do endividamento num ambiente de inflação alta e descontrole da economia. É um ledo engano achar que os devedores não farão dívidas novas. Nesse momento de restrição de crédito para frear o consumo, o governo aumenta o crédito consignado. A MP estabelece que 5% (cinco por cento) desse limite sejam destinados exclusivamente para suportar as despesas contraídas através do uso de cartões de crédito. Qual é a garantia disso? Passa a impressão que o governo atendeu ao Lobby dos bancos operadores das bandeiras de crédito, que já estavam sentindo na pele a iminência de calotes pela falta de pagamentos. Mais uma vez o governo fazendo graça com o dinheiro dos próprios brasileiros – as dívidas crescerão em efeito cascata em função do natural aumento dos novos compromissos contraídos no mercado. Quando a farinha é pouca, meu pirão primeiro. É aquela máxima: “Se ficar, o bicho come!”.

A MP 681 pode ser comparada àquele tiro que sai pela culatra. Mais uma irresponsabilidade do governo; a meu sentir, uma bola de neve está a se formar nas costas das pessoas. O indivíduo, tomador do empréstimo consignado, ratificará a sua condição de refém do sistema financeiro. O governo federal assume de vez o seu papel de maior incentivador da “agiotagem legalizada”. É imperioso que os brasileiros resgatem o seu poder de compra através de outros mecanismos e não por conta de artifícios paliativos, de eficácia momentânea, e totalmente na contramão da justiça social. O governo federal não está conseguindo fazer a sua parte, que é promover condições para a recuperação da economia e impermear o caminho do desenvolvimento e assim reconquistar a confiança dos empresários. O governo conspurcou a dignidade dos cidadãos, e estes esperam que seja devolvida sem arranhões. A população brasileira, economicamente ativa, por pressão das crises generalizadas, está de joelhos e com o chapéu na mão.

Conversando com um amigo sobre o tema “crise”, ele puxou do bolso a última fatura mensal que recebeu do cartão de crédito CAIXA / VISA, com data de vencimento 14/07/2015: CET Financiamento próximo período = 372,62% a. a. (Linha de crédito total no rotativo); CET CASH próximo período = 454,40 % a. a. (Linha para saques CASH, na boca do caixa). Perguntou-me: “Quem aguenta?”. Ninguém, eu respondi. O meu amigo completou: “Sou aposentado e ainda pago Imposto de Renda, descontado religiosamente no seu extrato mensal. Para se ter uma ideia, na minha Declaração do IRPF – Imposto de Renda Pessoa Física, Exercício 2015, Ano-Calendário 2014, os meus Rendimentos foram de R$ 34 mil, o Imposto Retido na Fonte foi de R$ 1,15 mil e o Imposto de Renda sobre 13º Salário foi de R$ 97,00. Fico pensando o seguinte: Se realmente o governo quer ajudar os aposentados, então que comece isentando-os do pagamento do Imposto de Renda”. Esta sim seria uma compensação real – pensei comigo mesmo. Numa terça-feira, 03 de maio de 2005, eu escrevi o artigo abaixo, de título bastante sugestivo. Dez anos e dois meses depois, o assunto volta à baila, é novamente comentado nas rodas.

Se correr, o bicho pega!

Aposentado é todo aquele que ficou dispensado de serviço, com direito aos vencimentos ou a parte deles. Entrementes, este estado de inatividade não o impede de tirar o traseiro da cadeira (Putz, isso pega!) para brigar pelos seus direitos, muito embora saibamos que a tendência é o Governo acabar com os seus direitos – ou com os aposentados. Prova disso, é a massificação das propagandas dos agentes financeiros, assistidas diariamente nos veículos de comunicação, sobretudo nas TVs abertas. É público, e é notório, o fato de que os aposentados não serão “abençoados” com um aumento de 15,38%, ocorrido sobre o salário mínimo em 1º de maio de 2005 – se o Governo conceder apenas a reposição da inflação do período, já será demais. Os pobres dos aposentados “com mais de um salário mínimo”, que também vivem de esperanças, esquecem-se, de repente, que os benefícios não são mais ligados ao salário mínimo (desde junho de 1991 foram desvinculados), e têm que se contentar – e lamber os beiços –, com reajustes baseados em outros índices liberalizados pelo Governo. De olho nesse nicho de desesperados, os bancos estimularão a tomada de empréstimos e, o que é pior, estarão, na paralela, construindo a “cultura da eterna dependência”, à qual os aposentados ficarão prisioneiros indeterminadamente. A agiotagem legalizada encara as taxas de juros como um simples detalhe na liberação do crédito pelo sistema de desconto em folha do INSS. Por sua vez, o Governo federal, ao invés de endossar esse comércio obsceno de dinheiro, deveria respeitar o direito da paridade, e assim evitar que os aposentados caiam em mais desgraça, já que a cada ano vêem corroída a sua aposentadoria. Se correr, o bicho pega!

Augusto Avlis

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Sobre augustoavlis

Augusto Avlis nasceu no Rio de Janeiro na metade do século XX. Essa capital foi antes o Distrito Federal e o Estado da Guanabara. Profissionalizou-se em Marketing Operacional e fez parte, como Executivo, de multinacionais do segmento alimentício por mais de três décadas, além de Consultor de empresas. Formado em Comunicação Social, habilitou-se em Jornalismo. Ocupou cargo público como Secretário de Comunicação. Hoje dedica-se às atividades de escritor e cronista.

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